Sinto-me como alguém que, ao menor descuido, descobre que lhe foram
levados seus últimos dez anos. Como é estranho olhar no espelho e não
enxergar mais aquela menina de vinte anos. Vou aos poucos concluindo
quem foram os meliantes, autores do furto de minhas já não mais
incontáveis horas. Acontece que o próprio tempo é um ludibriador de
primeira classe! Quando poucos anos eu ainda possuía, com toda sua
majestade e imponência, me vendeu a imagem de imensidão em quinze,
trinta, sessenta anos! Agora, tendo trilhado uma parte do caminho,
percebo que fui vítima de propaganda enganosa. Mas ele teve seus
comparsas! Pequenas distrações e ilusões foram implantados para que o
próprio tempo tivesse a oportunidade de escorrer pelas minhas mãos.
Entreguei, displicente, muito do meu bem mais precioso, assim 'de
bandeja' para quem menos merecia.
Autora: Candice Aureo
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segunda-feira, 10 de agosto de 2015
quinta-feira, 6 de agosto de 2015
Vespas e versos
Verso... Mal o tenho pronto; pouco no início, ainda sendo meio,
Depois que uma enxurrada de nada no silêncio me deixa.
Impetuoso, quero expô-lo aos toques, nas maciças aldravas,
Evocado às portas rudes e fechadas de remota queixa.
Arrastado por uma cheia de suaves e miúdas palavras:
Ora teclado, ora caderno, ora lamúria, que desajeitado leio.
Vou fazendo a rima aos poucos, no exíguo e escuro elevador,
Contornando a água que lentamente veio pouca e turva...
Ora de amor, ora de alagamento, ora de tardios encantos...
Em parágrafos, títulos, redondilhas e sílabas na curva,
Que docilmente imagino, escrevo, apago em disfarçados prantos,
Na rua, na sala de visitas, no hall, no fim do corredor...
Passam por mim a estrofe, os versos livres cata-ventos,
Como barcos, telas de plasma e dourada arte criptográfica,
Quando ainda nem há luz e logo se insinua tíbia sombra,
Quando ainda nem há luz e logo se insinua tíbia sombra,
Dormitando nas linhas do papel, sob a caneta esferográfica...
Verso não quer vir, ou ir, mas enfim me arrebata e tomba.
Quantos deles diluídos em lágrimas?... Rios lentos.
Separo do trigo o que não quero e jogo no ribeirão,
Na mudança das monções, nova direção do vento;
Aguardo a revisão, como de um texto inacabado.
O ponto e vírgula e a reticência submetem-me atento,
Como dócil e constante; benévolo servo subjugado:
Alteração de rumo a nado, parágrafo e travessão...
Em que sol é posto e ao final se reflete nas conversas,
Escrevo, tendo o derradeiro amor como inicial pretexto...
Ideias românticas a amontoarem-se em desarrumada pilha.
Semana inteira de domingos, fora do missal, fora do contexto,
Canto fora da época, como a ardilosa raposa em armadilha...
Escritos de amor, sempre às vésperas, ao contrário... Às pressas.
Circunstanciais, sibiladas conversas... Não faz mal!
Coloco flores na jarra, decifro sussurros, arcanos dos cofres:
Viro o casulo do avesso a procura do indescritível poema,
Vespas aveludadas voam velozes em apenas sete estrofes,
Afoitas articulando nos ares, sinuosas... Será que vale a pena?
Encerro-as no alfinete imperceptível e decisivo do ponto final.
Pontos reticentes espetam as asas invisíveis das abelhas no mural...
A sétima estrofe fica abreviada a três tímidos versos.
Acaba suave, volátil, veloz, mas muito desigual.
Autora:Valéria Áureo
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