Total de visualizações de página

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

A Lua I


A Lua, quando está triste,
Esconde-se em mim.
Eu fico na janela,
Eclipse dela,
Reflexo marfim.
Eu, quando estou triste,
Escondo-me nela,
Que fica iluminada
Em quarto crescente,
Minha dor minguante,
Cheia de esperança,
De uma lua nova.

Autora Valéria Áureo


In: Sentimento Disponível

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Canto para Minas




Minas minhas manhãs
Mornas, verdes, perfumadas...
Pela casca de laranja e canaviais.
Bálsamos das neblinas, esmeraldas,
Nas nuvens esparramadas, turmalinas
Nos densos milharais.
Minas meus minérios...
Névoas de Barbacena, lamparinas.
Ladeiras do sobe e desce,
Aromas, cores e roseirais
E seus impérios e campos.
Frágeis folhas, capim e touceira,
Pão de queijo, doce, café
Que a mulher mineira tece
À mesa as crianças, açucenas
À noite as rezas e os adereços
Homens e mulheres nos terços.
Palhas de milho espalhadas...
Fumaça de chaminé. Córregos,
Cavalgadas,
Currais, bois... Estradas...
Novenas,
Capelinhas, mourões e toras.
Frutas macias, cantos, moendas.
São Minas de Cataguazes, mangadas,
Barrancos nos rios e lavadeiras...
Alambiques, tonéis e talhas
Piabas, traíras e folhas de bananeiras.
Tocantins, Silveirânia, Ubá,
Minas de Piraúba, samambaias...
Doceiras.
Troncos de jequitibá. Laranjeiras...
Pomba, Mercês, Taboleiro!
Cidades pequenas, tropeiros,
Selas e cangalhas, milho e fubá...
Arreios, suores e afã.
Estradas de terra, bem-te-vi, sabiá,
Pardais, canários e ribeiras...
Montanhas cheirosas, pés de romã.
Grotas das maritacas; capim!
Chaleiras, currais e estacas
Fornos, carvão e cordilheiras,
Sobe e desce das ribanceiras
Essa vida não tem fim!
Lambaris, córregos... Cavaleiros
Nos lombos dos animais;
Parada, descanso, fogueiras...

Anzois, linha, iscas nos embornais...
Tropas às margens dos rios,
Das águas de minhas Gerais


Autora: Valéria Áureo -
in: Sentimento Disponível

segunda-feira, 12 de junho de 2017

WORDART


Nickname: Lobo do Mar, ou Selvagem;
Tigrão, Cinquentão, Meia-idade.
Tu sonhas como seria
Ter um affaire com Maria.
Encaminhas cópia oculta
E enalteces teu pen drive:
Um Bill Gates, uma Microsoft!

Vendes mil beijos na boca
Que se fazem inocentes,
Ícones, propostas loucas,
Envidraçadas nos dentes,
Expostas no monitor.
E te ofereces, webmaster,
Fazendo upload com outras.

Na tela... No espaço... Dás enter!
Beijos entalhados no ventre
De invisível sedutor,
Embutidos nos Emails
Nos recados, nos correios
De uma loura Leonor...

Isauras, Teresas, Estelas,
Marias, Angélicas tão belas...
Tão longe, tão perto e conciso,
Resumes teu aplicativo:
Um potente hardware.

Wordart tu pões em destaque.
Copias e colas... Navegas;
E vens afoito ao ataque!
Diante do laptop, ativo...
Galante! Stop! Um hacker...
Galante e conquistador…

Emotions, documents, pecados...
Precisas deixá-los gravados
No webcam. Meia-noite... De anseios...
No corpo, no home Page, nos seios,
Na página da negra Neide.

Delete! Mais uma ao mar!
Antes que a ingênua, incauta,
Descubra da ruiva Cleide, o avatar.
Que enciumada e triste, deixa estar...
Neide desnuda queira se matar.
Azar... Tu pensas: sobra-me a Guiomar!

Que fuja, ou te trate mal, internauta...
Ou troque o segredo, a senha,
A que melhor te convenha...
Mas não faz mal:
Neste mundo virtual
Até mesmo a Maria da Penha
Pode te consolar.

Já com a saudosa Grace,
Nem ao menos um Backspace...
No Excel dois mil e sete,
Calculas o potencial de Ivete.
No alinhamento de dados:
Uma para domingo,
Outra para sábado.

Queres levá-las com o tempo em resenha,
Arrastá-las pela Web, em aventuras.
Digitas, editas, salvas, envias e programas...
Acesso rápido. Área de transferência:
Pensas: quiçá hoje eu levo uma pra cama...
Não está Alice, mas está a Penha.
Não sendo a Rosa, talvez a Ana.

Conectado a roteador. Lento…
On line... Com sólido argumento,
Tens só um pensamento:
Realizo teus sonhos! Faço loucuras!...
Ah! Férteis mensagens, promessas,
No Skype, nas longas conversas.
Coloridas de confetes. Advertes:
Tenho mil beijos pra Beth,
Disponíveis, top secrets… Chicletes.
Para o corpo acomodar Elizetes
Nos blogs, no Facebook de Anetes.

E, tua boca cedente, ao vivo,
Em closes, by Messenger, prometes:
Segredas só para uma,
Como se só uma houvesse...

Uma paixão descabida. Um arquivo,
Um livro aberto, disseste.
Download... Sem você eu não vivo!
Mentes... À outra, à última conheces...
Insensível, à primeira argumentas:
Vê se me esquece!

Configuras, atualizas teu banco de dados,
Software, com muitas mulheres,
Mesclando funções e cores
Formatas opções de amores,
Diverte-te. Da forma que queres,
No link de tantos desejos: Lolitas,
Balzacas, mulheres insones, aflitas,
Que loucas imploram na noite:
Jamais me abandones!

Acabas falando sozinho.
“Te irritas”: Cadê a Benedita?
Por que não está a Anita?
Off line, desconectado...
Deixa ao menos um recado!
Mulheres malditas!

Acabas clicando no nada.
Na noite e de madrugada,
Na rede dos continentes...
Vagueias, persistes, insistes:
Isauras, Teresas, Estelas,
Rosas, Giseles, Helenas?
Tão belas...
Toda mulher vale a pena!
Sem saberes, ao menos onde...
E quantas, e quem são elas...

Vírus, falácias espalhas...
Mentiras, spams e banners,
Dia e noite, todo o ano;
Ah! Les femmes...
Com propósito de engano.
Tramas na Rede as malhas:
Não esqueças que eu te amo!

Eu seria Maysa, Piaf, Dolores,
Uma mulher de muitas dores,
Se em ti acreditasse.
Basta! Some, vê se te afastas!
Apaga meu endereço!
Eu, por mim, já te esqueço!
Eu te alerto: nem és meu dono!...
Eu te pergunto: Salvar Como?


Autora: Valéria Áureo

Antologia do I Concurso de Poesias
Prêmio Amigos do Livro /Filipoços – 2010
Pag.70

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Leilão ( Poesia do Descontentamento)




Quanto é que me dão
Por um Estado falido:
Um pacote, dois malotes,
Três envelopes...
Faltando trinta e cinco mirreis
No lote?
Quanto é que me dão, meus senhores,
Por uma maleta vazia,
Que já foi proxeneta valiosa
E já pagou tanta orgia?

Quanto, enfim, valem os tonéis,
Os segredos, encontros e os papéis...
Dos ditos e poderosos coronéis?
Quanto é que me dão? Senhores:
Os vinhos, talheres e as joias da coroa,
A baixela e a faixa da presidência,
E das ruas os violentos clamores?
Quanto vale esta maleta:
Já comprou governador, juiz e a tia,
A irmã, a esposa e a amante,
Em negociata cara e desonrosa
E acelerada decadência?
Quanto me dão, meus senhores,
Nesse montante
De horrores?
Para pagar a falência,
Os truques dos poderosos?
Quanto é que me dão pela sacola,
Que foi vazia e voltou cheia de joia,
Que adornou ministro e atriz,
A título de esmola?
Quanto é que me dão por um político
Inclemente,
Um deputado, um senador, ou presidente,
Advogado, ou um empreiteiro feliz?
Um povo passando fome
Insultando e brigando ente si,
Enquanto os corruptos indecentes
Enchem as burras e as valises
E se divertem com suas meretrizes,

Ocultos em seus codinomes?...
Quanto é que me dão pela lista...
Daqueles que ocultam seus nomes
E se dizem inocentes
Gozam e morrem de rir?
Quanto me dão pela Esplanada,
Câmara, Congresso pagos em milhões,
Bilhões, trilhões e “estalecas”,
Onde ninguém não viu nada?
Ninguém nunca soube e nunca viu?
Nada no Palácio Alvorada!
Quanto é que me dão pelo Brasil?
Quanto vale esta merreca?


Autora: Valéria Áureo
26/05/2017

terça-feira, 23 de maio de 2017

O Trem





O trem treme no trilho

E traz trezentos trabalhadores.

O trem vem de Petrópolis.

Trinta e três desembarcam atrasados,

Duzentos e sessenta e sete

Seguem viagem...Outros na estação.

Treze sentam atrás.

Os outros sentam à frente.

O cobrador atrapalhado

Troca três por dois trocados.

No trânsito congestionado,

Todos pedem passagem.

Só o trem não fica travado.

Na trama do trilho o trem vai...

No atrito do tráfego entroncado,

Só o trem não se atrapalha:

O trem nunca erra o trajeto,

Nunca deixa a estrada de ferro

Segue a viagem... Abafa o berro.

Traz atriz, traz trapezista,

Traz trombone, traz artista
Traz espartilho e saia.

Traz tranca para porta de trinco,

Traz trova, traz travesseiro e prato.

Traz o trágico professor de teatro.

Traz trecos, traz trupe, atores...

Traz índio da tribo tabajara...

Traz trapos e cobertores.

Traz estrondo dos tambores

E tropas de cavalos e burros.

O trem todo dia trabalha,

Já carregou mais de um trilhão

De tralhas e gente em frangalhos.

Traz cacarecos. Traz trigo, traz milho,

Apetrechos, trevos, bonecos e grilos,

Jogadores, tabuleiros e baralhos.

O trem nunca pega a contramão.

No fim da viagem, troca de carro e carvão.

O foguista enfim descansa

E apaga a grande fornalha.

O motorneiro trava a cancela,

Apaga o cigarro de palha.

O trem para na estação,

Faz barulho de trovão

Chia, treme e solta fumaça:

Piu ... Piu ...

E esvazia o vagão, 

O carregador descarrega a bagagem,
O passageiro entrega a passagem,

E o palhaço faz graça e trapaça
E afaga a pança em ridícula massagem.

Francisco toca o trombone na praça

E todo mundo alegre se abraça.




Autora: Valéria Áureo

Poesias Infantis In: Carrossel de Vento



domingo, 7 de maio de 2017

O café



No café das duas horas,
Meu coração comprometido,
Fica dolorido e chora.
É hora em que a emoção recolhe
Os ansiosos sonhos, e me escolhe,
Eu, que tenho tantos anos percorridos.
Olho pra trás destoado, em desenganos,
Enternecido pela mão do tempo.

Às duas horas é meu tempo de saudade
Em que eu sorria para minha mãe.
Acariciadas em afagos mudos, eu e ela,
Configurando em suave lentidão, a minha idade.
E nós plantamos as mesmas samambaias,
Os mesmos beijos e as mesmas dálias,
Dependuradas, cada uma, nos vãos,
Desse jardim suspendo, insólito, desbravado,
Magnífico, etéreo, iluminado,
Erguido a quatro mãos.

No café da tarde ainda colho flores
Dessas saudades, que plantei aqui,
Sanguíneas, rosas encarnadas,
Cujo perfume destilei de ti.

Há ternura às duas da tarde,
Há violetas e palavras soltas,
E chuva, planos, um café, mais outro...
O eterno afago das mãos de minha mãe
Entre o café, o bolo, o pão e o biscoito...

Às duas horas é meu tempo de saudade
Em que eu sorria para minha mãe.


Autora: Valéria Áureo
In: Sentimento Disponível

sábado, 6 de maio de 2017

Caixinha


Fiz uma caixinha de cetim,
Rendinhas, rococós e laçarotes
E pus pedrinhas e marfins.
Guardei ali muitos sonhos
De rosa, hortênsia, jasmim.
Cheirava a gerânio e dálias
E suspiros e saudades
E lilases e camélias.
Tinha véus e suaves madrepérolas,
Madressilvas, alfazema, violetas,
Luzes, luzes, borboletas...
Era caixa para quarto de meninas,
Para Patrícia, Valéria, Margareth e Elizabeth.
Cor-de-rosa, perfumada, azul celeste...
Para guardar bilhetinhos encantados
E broches e medalhas e santinhos.
Era caixa para guardar coisas de moça.

Guardei batom, florezinhas,
E pus perfume e ternura
E amor , dentro de um maço
De rosas, trigo e azevins...
Cobri tudo com um laço
Brilhante de nostalgia
E mandei com um abraço
Para a mãe guardar para mim.


Autora: Valéria Áureo
In: Sentimento Disponível